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Nova PEC n°108 pretende privatizar o COFEN

08/08/2019 20/08/2019 11:20 2487 visualizações

O ministro Paulo Guedes, da Economia, pretende transformar o Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), e os demais conselhos brasileiros, em sociedades privadas. Com isso, ele desobriga a inscrição compulsória (e, consequentemente, o pagamento de anuidades) e estabelece limites de atuação dessas entidades com relação ao poder de tributar e aplicar sanções.

A Proposta de Emenda à Constituição – a PEC 108/19 – foi apresentada pelo ministro, em 9 de julho, quando ele defendeu que os conselhos profissionais não integram a estrutura da administração pública e que não são autarquias.

Segundo o site PGE, o ministro Paulo Guedes falou, por meio de sua assessoria de imprensa, informou que o objetivo da PEC é deixar claro que os conselhos não fazem parte da administração pública, mediante a definição de que eles são entidades privadas sem fins lucrativos que atuam em colaboração com o poder público, às quais se aplicam as regras do direito privado. Segundo a nota de Guedes, da mesma forma, o texto da proposta também explicita que os trabalhadores desses conselhos sujeitam-se às regras da legislação trabalhista e, portanto, não são servidores públicos.

De acordo com o site, para ele, essas definições são necessárias para dar segurança jurídica aos conselhos, aos gestores e à sociedade, e pacificar os conflitos de interpretação sobre a sua natureza jurídica, ao reafirmar a autonomia política e administrativa dos conselhos. Mas o ministro ressaltou que a PEC não interfere na autonomia dos conselhos e que continua cabendo à legislação dispor sobre criação e definição de competências dos conselhos, que permanecem com o poder de fiscalizar e aplicar sanções.

Segundo o presidente do SEET, Claudean Pereira Lima, é lamentável toda essas mudanças que fragilizam as classes trabalhadoras e suas representações. "O Sindicato ver este caso com preocupação, mas ao mesmo tempo há pontos positivpos que precisam ser muito bem discutido e com mais cautela para que o trabalhador não fique no prejuizo, por tanto é importante toda a categoria acompanhar este o andamento desta propositura, para que todos possam dar apoio aos Conselhos e Sindicatos, que podem fazer as intervessões na tentativa de evitar prejuizos, que é o papel das entidades, defender os trabalhadores" ressalta.

Como ficaria a Constituição

Se aprovada essa PEC, o texto da Constituição passaria a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 174-A. A lei não estabelecerá limites ao exercício de atividades profissional ou obrigação de inscrição em conselho profissional sem que a ausência de regulação caracterize risco de dano concreto à vida, à saúde, à segurança ou à ordem social.” (NR)

“Art. 174-B. Os conselhos profissionais são pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos, que atuam em colaboração com o Poder Público.

  • § 1º O pessoal dos conselhos profissionais sujeita-se às regras da legislação trabalhista.
  • § 2º Lei federal disporá sobre as seguintes matérias relativas aos conselhos profissionais:

I - a criação;

II - os princípios de transparência aplicáveis;

III - a delimitação dos poderes de fiscalização e de aplicação de sanções; e

IV - o valor máximo das taxas, das anuidades e das multas.

  • § 3º É vedado aos conselhos profissionais promover, facilitar ou influenciar a adoção de práticas anticompetitivas em sua área de atuação.
  • § 4º A imunidade de que trata a alínea “c” do inciso VI do caput e o § 4º do art. 150 se estende aos conselhos profissionais.” (NR)

O que pensa o Cofen sobre o tema

Em 25 de julho, uma comissão composta por presidentes de conselhos de diversas categorias se reuniu, em Brasília, na sede do Conselho Federal de Corretores de Imóveis, para abordar o tema. Essa comissão decidiu compor uma proposta alternativa à PEC 108/19 e apresentá-la aos parlamentares e ao ministro Paulo Guedes, buscando não comprometer a eficiência dos trabalhos realizados pelos conselhos profissionais.

A proposta gerou inúmeros debates devido ao texto não esclarecer, de maneira objetiva, alguns pontos considerados desfavoráveis ao interesse da sociedade. O presidente do Cofen, Manoel Neri, considera que a PEC 108/19 possui aspectos positivos e negativos. “O texto da proposta precisa ser aperfeiçoado em conjunto”, ressaltou.

O que mudaria em uma entidade privada?

O ministro Paulo Guedes destaca, como um dos fatores preponderantes da PEC 108/19, o fato de os conselhos serem considerados entidades privadas e não autarquias públicas.

Dessa forma, os registros profissionais seriam opcionais. Desobrigando a inscrição compulsória dos profissionais, os conselhos não poderiam cobrar as anuidades e, provavelmente, não teriam recurso suficiente para se manter e para fazer a fiscalização.

Relatório de fiscalização do TCU

Segundo o relatório de fiscalização do Tribunal de Contas da União (TCU), que foi base para a composição da PEC 108/19, do ministro Paulo Guedes, foi realizada uma auditoria na modalidade de Fiscalização de Orientação Centralizada (FOC), concebida com o objetivo de avaliar, em âmbito nacional, o controle da gestão, as receitas, a regularidade das despesas com verbas indenizatórias, as transferências de recursos para terceiros e prover um panorama inicial das atividades finalísticas dos conselhos de fiscalização profissional, conforme consignado na proposta de fiscalização contida no TC-030.312/2016-7.

Para a referida auditoria, foram aplicados questionários com 39 perguntas aos conselhos, que versavam sobre temas como: receitas, despesas, gastos com indenizações (como jetons, diárias, auxílios representação, entre outras), com folha de pagamento e com publicidade, valores das anuidades, quantitativo de empregados (efetivos, comissionados, terceirizados e estagiários), número de fiscais, número de conselheiros, quantitativos de profissionais e empresas registrados, entre outras questões.

De posse dessas respostas, o relatório colheu informações que deram suporte à PEC 108/19. Importante salientar que o relatório do TCU apontou que essas entidades possuem cinco principais funções, que são registro, normatização, fiscalização, julgamento e orientação.

O questionário foi aplicado a todos os 559 conselhos (sendo 28 federais e 531 regionais). Ao todo, 540 conselhos responderam ao questionário, ainda que parcialmente (mais de 96% de respostas). Do total, somente 19 conselhos não apresentaram resposta (menos de 4%). Todos os conselhos de enfermagem responderam ao questionário.

No que tange às receitas orçamentárias, o total verificado na pesquisa para todos os sistemas de fiscalização profissional foi, no exercício de 2016, de cerca de R$ 3,8 bilhões. O relatório apresenta, por exemplo, o total distribuído em cada sistema. Destaca-se que não se trata do somatório direto das receitas orçamentárias dos conselhos regionais com as do conselho federal, pois, nesse caso, há a dupla contagem da cota parte (percentual de recursos repassados das regionais ao federal).

Dos 28 conselhos federais considerados, no que diz respeito à receita orçamentária, o sistema Confea/Creas (conselhos de engenharia e agronomia) é, de longe, o maior sistema, com um montante de R$ 940,3 milhões; seguido pelo de Medicina, com R$ 467,5 milhões; e, em terceiro lugar, pelo de Enfermagem, com R$ 380,5 milhões.

Estima-se que talvez somente a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) – que não faz parte do escopo daquele trabalho por não ser considerada uma unidade jurisdicionada do TCU (ou de qualquer órgão de controle) –, com seus mais de um milhão de inscritos, possua uma receita semelhante ao do sistema Confea/Creas.

Recursos em conta

O relatório apresentou, ainda, o volume total de recursos disponível em conta de cada sistema, em 31/12/2016, ou seja, o total de recursos acumulados, disponíveis em caixa para o exercício de 2017, sendo que o de Enfermagem possuía R$ 149,3 milhões (ficado em 5º lugar no ranking total).

Ao todo, no Brasil, a partir dos dados fornecidos pelos próprios conselhos, existem em torno de 7,8 milhões de profissionais registrados (pessoas físicas), sendo que O Cofen dispara na frente do ranking, com 1.874.001 inscritos (em 31/12/2016), ganhando, inclusive do Confea/Creas, que tem 1.341.118 inscritos no período.

Já em relação ao número de empresas registradas, no Brasil, o quantitativo total era de cerca de 1,3 milhões de pessoas jurídicas na mesma data. No ranking, o Cofen estava com 28.551 empresas registradas (em 13º lugar).

Baixa atividade fiscalizadora

Outro quesito que levou o Ministro a tomar a decisão pela PEC 108/19 foi porque, segundo ele, o sistema de conselhos profissionais demonstra baixa execução das atividades fiscalizatórias, principalmente na comparação entre o volume de recursos gastos nessa atividade e o volume de recursos gastos com rubricas como indenizações a conselheiros (jetons, diárias, auxílios representação e outras verbas indenizatórias) e com publicidade.

Já o comparativo entre receita orçamentária e despesas com fiscalização, indenizações a conselheiros e publicidade, no Cofen (2016) ficou:

  • Receita Orçamentária do Sistema – R$ 380.540.902
  • Fiscalização – R$ 54.587.852 (14,3%)
  • Total de gastos com Indenizações a conselheiros – R$ 17.486.626 (4,6%)
  • Publicidade – R$ 8.710.013 (2,3%)

Contudo, independentemente disso, a análise dos relatórios de gestão do exercício de 2016 e dos demais demonstrativos contábeis obtidos junto aos conselhos conduz ao entendimento de que, na grande maioria dos casos, o baixo desembolso com as atividades de fiscalização nos 28 sistemas de conselhos no Brasil não é decorrência direta da insuficiência de recursos financeiros dessas entidades.

O que se percebe é o oposto: os conselhos de fiscalização profissional são superavitários, uma vez que gastam menos do que arrecadam. No caso do conselho de enfermagem, os números são os seguintes (2016):

  • Receita orçamentária do sistema – R$ 380.540.902
  • Despesa orçamentária do sistema - R$ 366.411.766
  • Diferença (receitas e despesas) - R$ 14.129.135 (3,7%)

Ao final, o relatório buscou elencar as principais matérias que devem compor uma eventual lei geral de conselhos, mediante a realização de um debate em nível nacional: critérios para criação e manutenção dos conselhos; natureza jurídica; supervisão ministerial; consolidação da ideia de sistema a partir da ratificação do conceito de autarquia única para fiscalização de cada profissão regulamentada; caráter honorífico do cargo de conselheiro; avaliação da admissibilidade de remuneração das atividades de gestão quando exercidas por conselheiros; delimitação das fontes de receita em relação às anuidades, taxas, emolumentos e demais serviços prestados; conceituação e limitação de verbas indenizatórias; fixação de normas e critérios para a transferência de recursos para terceiros mediante convênios e contratos de patrocínio; e fixação de percentual mínimo da receita destinado às atividades de fiscalização.

Fonte: PGE